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Cenário provável 2022/23 na era da incerteza



Fábio Pinto Camargo Administrador, especialista em engenharia de produção, coordenador sênior na HBR Consulting.


O pior cenário possível para os negócios é o cenário onde reina a incerteza. Assim, as medidas e as ações que permeiam a tomada de decisão nas organizações – e na vida - estão voltadas para a redução da incerteza.


Logo, todo e qualquer esforço de planejamento para orientar a formulação da estratégia está amparado na análise, avaliação e mensuração dos riscos.


Risco, usualmente, é tido como uma ameaça à consecução dos objetivos, enquanto deve ser entendido também como oportunidade. O que se busca com o gerenciamento de riscos é ir do ambiente de incerteza para o ambiente de risco onde é possível conter ou mitigar ameaças e aproveitar oportunidades.


Em oposição à incerteza, o ambiente de risco permite que as variáveis que afetam a estratégia possam ser identificadas, listadas, analisadas, avaliadas, priorizadas e para elas se estabeleça tratamento. Em suma, isso possibilita que essas variáveis e seus efeitos sejam melhor controlados.


Seja feito por uma estrutura especializada, com método e usando as melhores práticas de gerenciamento de riscos, seja feito de modo empírico, utilizando o feeling, ao amparo da experiência e do conhecimento do negócio, de todo o modo, mesmo involuntariamente, a avaliação dos riscos influencia as decisões.


John K. Galbraith (1977), em seu livro a Era da Incerteza, referindo-se a como encaramos a morte – o risco supremo – constata que aprendemos a viver com a noção de nossa própria mortalidade e que nossas mentes aceitam a ideia, mas não alcançam a realidade. Fugimos desse pensamento, como temos a tendência de fugir da verdade quando desagradável, inquietante ou ameaçadora. É fácil e estimulante aceitar falas, análises e opiniões otimistas. Porém, nosso compromisso com a realidade exige que enfrentemos a verdade e tal exigência é tão maior quanto maior a nossa responsabilidade.


Recentemente, nada determinou mais a conjuntura econômica e ambiente de negócios do que a pandemia seguida da guerra Rússia-Ucrânia. Essa combinação de desastres sequenciais veio trazendo alta volatilidade aos mercados. Volatilidade traz imprevisibilidade e, esta, acarretando em incerteza eleva o risco.


Considerando todos os riscos e seus fatores ora presentes é possível afirmar que o atual nível de risco global é equivalente ou maior desde o fim da guerra fria ou mesmo da época da segunda guerra mundial.


Conforme relatórios recentes publicados pelo FMI, Banco Mundial, Comissão Europeia e, entre outros, pelo Bacen, o cenário que se vislumbra para o curto e médio prazo traz: aumento no preço das commodities agrícolas, minerais e metálicas; aumento no preço dos alimentos; aumento da inflação; elevação nas taxas de juros; e frustração do movimento de recuperação da economia após a crise causada pela Covid 19 atenuar-se.


Por último a guerra da Ucrânia acentuou os problemas de interrupção na cadeia de suprimento global advindos da crise causada pela pandemia. Afetando indústrias como as de semicondutores, automóveis e alimentos, a única certeza em um futuro próximo é o aumento dos desafios a enfrentar.


No caso do Brasil todos esses elementos estão presentes. Inclusive porque a economia brasileira já dava sinais de ter perdido momentum antes mesmo da deflagração do conflito.


Com o Bacen tentando conter a tendência inflacionária via aumento da taxa básica de juros em uma conjuntura margeando a recessão, não é factível pensar em crescimento da economia.


O aumento no preço das commodities irá favorecer os setores exportadores como a indústria de mineração (petróleo e minério de ferro) e como os de produção de carnes e grãos.


Nossa indústria e o agronegócio são altamente dependentes de matérias-primas, insumos agrícolas, equipamentos e componentes importados. Os setores exportadores de commodities são sensíveis ao custo de transportes que sofre o efeito da elevação no custo dos combustíveis.


Logo, ao tempo em que estes setores se beneficiam da alta de preços, sentem o efeito do aumento no custo dos insumos. Absorvendo total ou parcialmente o diferencial de preços reduz ou anula os ganhos na margem de lucratividade.


A inflação está corroendo o poder de compra do brasileiro. Enquanto se comemora o aumento na taxa de ocupação, assiste-se à queda na renda da população. Ante estas circunstâncias somadas ao mercado de trabalho formal ainda frágil, o comércio e os bancos preveem aumento da inadimplência.


Os setores fornecedores de bens e serviços não transacionáveis, a indústria e o comércio voltados ao mercado interno verão os seus respectivos riscos crescerem. Mesmo que o Bacen consiga controlar a inflação esse controle será parcial porque não há como impedir o Brasil de “importar” a crescente inflação dos países centrais.


Foi desconsiderado o fator de risco político em ano de eleições, como foi ignorada uma eventual expansão da guerra envolvendo a OTAN e seus efeitos sobre o Brasil.


O risco político, apesar do ambiente tumultuado, segundo informações das mais diversas fontes especializadas, tem baixa probabilidade de ocorrer com alto impacto.


No caso da guerra Rússia-Ucrânia, dado o fracasso da via diplomática para negociar uma solução, o risco do conflito expandir-se é alto.


As perspectivas para o cenário aqui descrito são semelhantes às descritas em artigo publicado pela agência de riscos S&P Global, onde: “O conflito militar Rússia-Ucrânia pode ter efeitos profundos nas perspectivas macroeconômicas e nas condições de crédito em todo o mundo. Antes e durante o conflito, os países ocidentais anunciaram sanções rigorosas a entidades e indivíduos russos. Isso aumenta o risco de restrição ao comércio e aos fluxos de capital e pode pesar na confiança geral e nas condições de negócios. A longo prazo, as divergências entre a Rússia e a OTAN sobre questões de segurança provavelmente persistirão e o risco geopolítico crescente pode levar a ramificações mais amplas.” (Disponível em https://www.spglobal.com/ratings/en/research/articles/220304-russia-ukraine-military-conflict-key-takeaways-from-our-articles-12300240. Acesso em: 24 de maio de 2020).


A sua eventual ocorrência implicaria em um risco sistêmico, de amplitude total e impacto catastrófico para o que não há proteção possível e cujos efeitos são imprevisíveis. Portanto, não está contemplado no cenário em questão.


Os fatores de risco elencados resumem o contexto que o planejamento estratégico deve considerar. Todavia, ressalva-se que embora o contexto abranja a todos, os riscos são distintos, com probabilidade de ocorrência e impacto próprios a cada organização.


Assim, perante o contexto atual, identificar, medir e controlar os riscos do negócio assumem destaque e prioridade. O gerenciamento de riscos deve ser tomado como inevitável para, senão assegurar, aumentar a efetividade com que a empresa responderá aos desafios.


Voltando à questão da verdade/realidade é preciso enfatizar que encarar a expressão dos fatos e dados, mesmo sendo desfavorável como agora, é requisito absoluto para reduzir a possibilidade de prejuízos e aumentar a capacidade de identificar e aproveitar oportunidades.


Concluindo, ante o cenário provável as organizações empresariais precisam, mais do que nunca, saber gerenciar seus riscos. Devem poder determinar seu próprio cenário de negócios e dali definir sua estratégia. Acompanhando-a e ajustando sua execução às mudanças no ambiente de risco interno e externo, estarão agindo proativamente para melhor assegurar que os objetivos sejam alcançados.

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